segunda-feira, 31 de maio de 2010

PASSEMOS, TU E EU, DEVAGARINHO


Sem ruído, sem quase movimento,
Tão mansos que a poeira do caminho
A pisemos sem dor e sem tormento.

Que os nossos corações, num torvelinho
De folhas arrastadas pelo vento,
Saibam beber o precioso vinho,
A rara embriaguez deste momento.

E se a tarde vier, deixá-la vir...
E se a noite quiser, pode cobrir
Triunfalmente o céu de nuvens calmas...

De costas para o Sol, então veremos
Fundir-se as duas sombras que tivemos
Numa só sombra, como as nossas almas.

Reinaldo Ferreira
 

NUVENS

Encantei-me com as nuvens, como se fossem calmas
locuções de um pensamento aberto. No vazio de tudo
eram frontes do universo deslumbrantes.
Em silêncio via-as deslizar num gozo obscuro
e luminoso, tão suave na visão que se dilata.

Que clamor, que clamores mas em silêncio
na brancura unânime! Um sopro do desejo
que repousa no seio do movimento, que modela
as formas amorosas, os cavalos, os barcos
com as cabeças e as proas na luz que é toda sonho.

Unificado olho as nuvens no seu suave dinamismo.
Sou mais que um corpo, sou um corpo que se eleva
ao espaço inteiro, à luz ilimitada.
No gozo de ver num sono transparente
navego em centro aberto, o olhar e o sonho.

António Ramos Rosa
 

sábado, 29 de maio de 2010

ÉRAMOS NÓS


E então, éramos nós
um corpo e outro,
entregues, envoltos
na noite, faróis
Éramos nós

E então, duas peles
de cores irmãs,
trocavam sabores,
rompiam manhãs
Éramos nós

E então, éramos nós
do tempo esquecidos
de carne ,tecidos,
ardendo, a sós
Éramos nós

E então, artistas que somos,
brincamos de cores, com nossos lençóis
Os pincéis que usamos?
Trouxemos guardados, bem dentro de nós
Éramos nós

E mais nada havia,
na casa vazia,
tão cheia de nós
E o tempo de ir,
se aproximava
e a saudade chegava
precisa, veloz
Éramos nós...

Ana Maria Vergne de Morais
 

sexta-feira, 28 de maio de 2010

ÁGUA NASCENDO

Fiz castelos de areia
sonhos de vento
abri cavernas no mar
construí segredos
teci com teias de luz
as mais delicadas
roupagens
inventei carruagens
adornadas de estrelas
para o dia
em que te encontrasse
e quando te vi
o amor era simples
o amor não pedia
nada mais
do que o milagre
da água nascendo.

Roseana Murray
In Fruta do Ponto
 

quinta-feira, 27 de maio de 2010

QUERO APENAS CINCO COISAS . . .

 
Quero apenas cinco coisas...
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera
para que continues me olhando.

Pablo Neruda

quarta-feira, 26 de maio de 2010

TEUS VERSOS EM MIM

Queria teus versos para mim!
Como quem deseja as gotas da chuva na face,
E sente percorrer a suavidade de sua textura...

Queria teus versos, todos assim!
Como quem precisa do perfume das flores,
Da brisa da manhã, que corre pela janela adentro.

Queria teus versos, todos, sim!
Para enfeitar de um colorido em arco-íris
O céu azulado, que protege todo o meu dia.

Queria teus versos, todos, por fim!
Inusitados, porém, de tal forma, amáveis,
Num desejar sem receios absortos.

Queria teus versos todos, enfim!
E os queria assim, de uma forma faceira.
Nas gotas da chuva, corriqueiras,
Na brisa serena, soprando orvalhos.

Eritania Brunoro
Publicado no Recanto das Letras em 22/07/2009
Código do texto: T1714155 
 

terça-feira, 25 de maio de 2010

NÃO VOU DESISTIR

Eu não vou
desistir do amor
nem da paz
nem das rosas
nem dos sonhos
nem de ti
e nem Deus
vai desistir
de mim...

Mesmo assim
haverá
mais espinhos
de plantão
do que flores
no jardim...

Pois o resto
é a razão
de ser assim...

Afonso Estebanez
http://afonsoestebanez.blogspot.com/
 

VAMOS PARTIR


Antes da chuva nos bater à porta
já tinhamos sonhado
agitar tempestades
só nos faltava construir
um caminho certo para os barcos

Partimos rumo ao improvável
sem repouso infinitos
inocentes
nós e a chuva

Em segredo estradas fora
construimos um barco
inventámos uma estrela
para seguir as aves
em pleno vôo

Partimos antes da chuva
sem conhecer o destino das tempestades
muito menos o frêmito
do tempo que faz

Vamos partir?
Estamos sempre a partir
e a chegar.

Eufrázio Filipe

domingo, 23 de maio de 2010

AMAR

Amar
É ouvir a tua voz, sentir os teus lábios e
o teu colo aconchegante,
É estar no areal junto ao mar e
observar a lua em noites de frio.
É olhar o céu e saber que cada estrela é um beijo teu
Segurar as tuas lágrimas de doce sal com o meu coração.
É ler contigo os poemas de todos os poetas.
Andar numa noite de inverno pelas ruas desertas
de volta para casa.
É dizer na mesa de um café as palavras certas
Transformar esse local nas nossas rimas de amor.
Amar…
É tocar estrelas sem sair do chão,
Tocar na essência do tempo,
entre o certo e o incerto,
Entre o dar e o receber...
Fechar os olhos e aprender a voar...
Amar é envelhecer querendo te abraçar.
Sônia Schmorantz

sábado, 22 de maio de 2010

QUEM AMA INVENTA

Quem ama inventa as coisas a que ama...
Talvez chegaste quando eu te sonhava .
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos ,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreição ...

Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente ,
Ou sozinhos , num ritmo tristonho ...
Ó! meu pobre , meu grande amor distante ,
Nem sabes tu o bem que faz à gente .
Haver sonhado ...e ter vivido o sonho!

Mário Quintana 

sexta-feira, 21 de maio de 2010

COMO UM BARCO

Como um barco assim cheguei
na calma ondulação das tardes
e a ti eu aportei...

E lento eu desfiz
a armação das velas e te amei
enquanto o sol brilhava...

E nas gotas que ficaram
nas curvas do teu corpo
dos suores de nós...

Reentrei firme e fundo
e nessas águas inventamos
o caminho para casa...


Eduardo Leal
http://anossapena.blogspot.com/

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O MEU AMOR EXISTE



O meu amor tem lábios de silêncio
e mãos de bailarina
e voa como o vento
e abraça-me onde a solidão termina.

O meu amor tem trinta mil cavalos
a galopar no peito
e um sorriso só dela
que nasce quando a seu lado eu me deito.

O meu amor ensinou-me a chegar
sedento de ternura
sarou as minhas feridas
e pôs-me a salvo para além da loucura.

O meu amor ensinou-me a partir
nalguma noite triste
mas antes, ensinou-me
a não esquecer que o meu amor existe...

Jorge Palma


quarta-feira, 19 de maio de 2010

TRAJETO

Na vertigem do oceano
vagueio
sou ave que com o seu voo
se embriaga
Atravesso o reverso do céu
e num instante
eleva-se o meu coração sem peso
Como a desamparada pluma
subo ao reino da inconstância
para alojar a palavra inquieta
Na distância que percorro
eu mudo de ser
permuto de existência
surpreendo os homens
na sua secreta obscuridade
transito por quartos

de cortinados desbotados
e nas calcinadas mãos
que esculpiram o mundo
estremeço como quem desabotoa
a primeira nudez de uma mulher

Mia Couto 

terça-feira, 18 de maio de 2010

EU E O VENTO . . .

Irei de mãos dadas com
O vento procurar seu
Cheiro...Sentirei o que emana da
Sua pele, reconhecerei
Sua essência...

Brincarei com os seus
Cabelos, beijarei sua boca
Em um breve roçar de ternura...

A brisa do meu coração
Irá soprar doce canção
Para acalentar sua tristeza.
E o vendaval dos
Meus desejos
Expulsará suas solidões...

Dançarei em volta do seu
Corpo e levarei comigo
Toda a sua incerteza se te amo...
E meu amor brincará em seu
Sorriso até o adormecer da
Saudade...


(© Cida Luz) 

segunda-feira, 17 de maio de 2010

QUERIA TANTO VOAR


Queria tanto voar
Ou ser somente vento
Ser onda do mar
Ou estrela no firmamento

Bastava ser assim um dia
Ficaria assaz contente
Por momentos ser livre bastaria
Como nómada gente

Queria ser livre de mim
Soltar- me das minhas amarras
Estar presa em ti assim
Como quando me agarras

Queria ser livre somente
Dentro do teu abraço
Prender-me eternamente
No calor do teu enlaço

domingo, 16 de maio de 2010

NÃO ME ESQUEÇAS

Por favor, não me esqueças,
Só porque o mundo gira e rola,
As aves evadem-se para Norte
E as flores recolhem-se, no silêncio..
Por favor, não me esqueças,
Nem quando a lua se esconde, no céu,
E as nuvens viajam, clareadas,
Na noite que desce sobre nós.
Por favor, não me esqueças,
Até que eu chegue ao sol poente
E me volte para ti, acenando,
Suba o arco-iris, cantando,

E desapareça na névoa e no mar..
Só, então, sim, tu podes, tu deves
Esquecer-me. Não serei mais
Que uma onda de espuma
Banhando a areia.

ILona Bastos

sábado, 15 de maio de 2010

QUERIA . . .

Queria falar do meu amor,
dos sonhos que tenho,
da tarde que agora vai,
do sol que se põe e da lua
que começa a surgir.
Queria fechar os olhos,
esquecer o relógio
me perder nas horas,
fugir do tempo e ficar assim,
contando as pétalas de uma flor amarela.
Bem me quer, mal me quer…
Queria falar da chuva que cai,
do vento que varre as folhas do chão,
das ondas encrispadas do mar,
do tempo que brinca com a solidão.
Queria, queria, queria…
Mas fiz-me doçura da pétala,
flor pequena em sua mão,
amor que acontece e se enraiza,
crescendo como flor no coração…

Sônia Schmorantz